quarta-feira, 26 de setembro de 2012

UNESCO concede prêmio vergonhoso

Tutu Alicante, fundador e diretor executivo da EG Justiça, uma ONG que se concentra em melhorar os direitos humanos e a governança na sua nativa Guiné Equatorial, relata sobre as últimas notícias a respeito do prêmio da UNESCO ao presidente Obiang.

Tem sido uma semana preocupante para aqueles entre nós preocupados com a corrupção e a má governança. E é um dia problemático para a maioria dos guinéu-equatorianos.
Na terça feira à noite, a UNESCO concedeu o prêmio controverso patrocinado pelo Presidente Obiang, da Guiné Equatorial, meu país natal. A decisão de fazer isso é uma vergonha à organização e um revés no esforço para pressionar a boa governança e a prestação de contas do governo na Guiné Equatorial.
O UNESCO - Prêmio Internacional Guiné Equatorial para Pesquisa em Ciências da Vida foi concedido, apesar de um clamor global sem precedentes de uma miríade de atores, incluindo os prêmios Nobel, os ganhadores do prêmio Cano, destacados intelectuais africanos e latino-americanos e figuras literárias, cientistas, profissionais de saúde pública, grupos de liberdade de imprensa e organizações da sociedade civil.
Muitos guinéu-equatorianos falaram bravamente contra o prêmio, assim como muitos outros africanos, incluindo campeões proeminentes da justiça social como o arcebispo Desmond Tutu, o vencedor do Prêmio Nobel Wole Soyinka e o renomado escritor Chinua Achebe. Suas vozes foram ignoradas pelos delegados da UNESCO, aparentemente mais preocupados em reforçar os seus laços diplomáticos e de negócios frente ao regime de Obiang e mais de pé com a falsa ideia de “Solidariedade Africana” do que com a defesa dos princípios defendidos pela UNESCO.
Ao avançar com o prêmio, a UNESCO está ajudando a lavar a imagem de um homem que, rigidamente, controla o poder desde 1979 e que aparece com a intenção de criar uma dinastia familiar por, eventualmente, entregar o poder ao seu filho. Aquele filho, comumente referido como Teodorín, é o objeto de uma investigação de corrupção nos Estados Unidos e é procurado sob um mandado de captura internacional emitido semana passada na França – o mesmo país em que a cerimônia de premiação ocorreu.
O objetivo declarado do prêmio UNESCO é “contribuir para a melhoria da qualidade de vida humana”. Tendo estado no poder por 33 anos, o Presidente Obiang teve tempo suficiente para melhorar a qualidade de vida humana dentro do meu país. No entanto, a grande maioria dos guinéu-equatorianos permanecerem atolados na pobreza, sem acesso confiável a água potável ou a bons cuidados de saúde. O Presidente Obiang, sua família e colaboradores mais próximos, por outro lado, apreciam estilos de vida escandalosamente luxuosos com o dinheiro obtido através da riqueza em petróleo da Guiné Equatorial.
A hipocrisia do prêmio é ainda delineada pela detenção, politicamente motivada, do Dr. Wenceslao Mansogo Alo, um médico muito respeitado em um país com poucos médicos qualificados. Dr. Mansogo, que também é ativista de direitos humanos e líder de um partido opositor, teve sua licença médica revogada e sua clínica fechada, apesar de receber um indulto do presidente Obiang em junho de 2012.
A perseguição ao Dr. Mansogo não é única: guinéu-equatorianos são mantidos em estado de medo por um regime que utiliza a prisão arbitrária, a perseguição e a tortura para intimidar vozes críticas dentro do país.
Em março, quando a UNESCO aprovou o prêmio, alguns dos 33 delegados da UNESCO que votaram a favor (18 votaram contra e seis se abstiveram) afirmou que o prêmio demonstrou que os países em desenvolvimento podem ajudar a si mesmos. Sim, isso é verdade. Eles podem. E eles deveriam. Mas os países em desenvolvimento não são ajudados por um prêmio que reflete a má governança.
Apesar do nome, este não é um prêmio apoiado pelo povo de Guiné Equatorial.
Este é o prêmio do presidente Obiang. Ele decidiu unilateralmente dar à UNESCO $3 milhões do Tesouro do Estado, em um esforço para polir sua imagem internacional manchada.
A decisão da UNESCO de suspender o prêmio em 2010 e 2011, em resposta à pressão esmagadora, era de abrir os olhos para muitos dos meus compatriotas homens e mulheres. Para, talvez, pela primeira vez, perceberem que o Presidente Obiang não era invencível. Isso abriu uma rachadura na fachada de seu regime todo poderoso.
Temo que a infeliz decisão geopolítica conduzida para atribuir o prêmio vá fechar essa fenda, extinguir o raio de esperança e dar raiz ao cinismo endurecido, onde guinéu-equatorianos acreditam que a comunidade internacional virou as costas para eles. Em certo sentido, a UNESCO já fez.
Siga a EG Justiça no Twitter:  @EGJustice

Pelo Convidado do Blog Tutu Alicante
Versão em Português: Mônica Brito

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