segunda-feira, 2 de julho de 2012

O ativista de direitos humanos guiné-equatoriano Tutu Alicante fala contra a corrupção

Ao longo dos últimos meses, a ONE tem se tornado muito interessada nos assuntos do governo da Guiné Equatorial, um pequeno país de língua espanhola na costa ocidental da África. O país, que abriga reservas de petróleo consideráveis, é um dos mais ricos do continente, mas também tem distribuição mais desigual de riqueza. Cerca de 70 por cento do país vive abaixo da linha da pobreza, enquanto os detentores do poder estão vivendo uma vida de incrível opulência.
A causa para essa disparidade é, inquestionavelmente, a corrupção; especificamente, nos extrativos (petróleo, mineração, gás, etc.) da indústria. Para saber mais sobre esta questão na Guiné Equatorial e além, falamos com Tutu Alicante, um advogado guiné-equatoriano de direitos humanos e diretor executivo da EG Justice (Link em inglês EG Justice), uma ONG dedicada ao combate à corrupção na Guiné Equatorial. Você pode reconhecer o seu nome através do nosso e-mail no início de nossa campanha transparência de extrativos, onde ele expressou sua indignação frente empresas que negam a milhões a chance de escapar da pobreza extrema.
Em nossa entrevista, ele fala sobre como começou na atividade anticorrupção, da travessura do Presidente Obiang da Guiné Equatorial e como os membros da ONE podem se envolver mais na promoção da transparência.


Como você começou?
Eu cresci na Guiné Equatorial e assisti uma série de coisas horríveis. Em 1993, houve um incidente em Annobón, minha cidade natal, onde dois jovens foram mortos e vários homens foram severamente torturados. Muitos jovens correram para a floresta com medo, inclusive meu primo. Quando o governo não conseguiu encontrá-lo, queimaram a nossa casa.Eu tive uma conversa com meu pai quando lhe perguntei o que deveríamos fazer, e ele disse que não havia nada que pudéssemos fazer. Como um homem jovem aquelas eram palavras chocantes, que o governo poderia simplesmente fazer o que quisesse – com absoluta impunidade – e não haveria nada que você pudesse fazer. Eu vim para os EUA um ano depois, pensando que eu me tornaria um jornalista. Mas durante a faculdade, quando o petróleo foi descoberto na Guiné Equatorial, percebi que o petróleo ia ser fundamental para o futuro do meu país. Eu queria saber o que aconteceria com as receitas desse recurso natural, sabendo que ia criar uma fissura econômica, política e social. Então, tornei-me um advogado, pensando que a lei me daria ferramentas para defender o Estado de Direito, os direitos humanos e a transparência.


Pode nos falar um pouco mais sobre a ideia de “acordos secretos” entre empresas petrolíferas e governos? Acho que para muitos americanos, isso aconteceu um pouco como surpresa.

Quando o petróleo é encontrado em um lugar como Guiné Equatorial, o governo assina um acordo com empresas multinacionais de energia para explorar, produzir e distribuir o óleo. Como parte do contrato, as empresas de energia são obrigadas a fazer vários pagamentos ao governo do país de acolhimento; incluindo pagamentos de bônus, royalties, impostos nacionais e vários outros tipos de taxas.Em países com tradição regular do Estado de Direito, e controles e balanços, esses pagamentos são contabilizados e feitos de forma transparente. No caso da Guiné Equatorial, no entanto, onde o presidente e sua família estão acima da lei e não fazem distinções entre o Estado e suas contas pessoais, informação a respeito de pagamentos é mantida em segredo. Então, pessoas - incluindo parlamentares – hoje não sabem quanto petróleo está sendo produzido, ou quanto está sendo coletado em receitas.


A ONE tem acompanhado as travessuras do Presidente Obiang já há algum tempo. Ele nunca o deixa completamente louco? Por que os cidadãos da Guiné Equatorial não fazem nada sobre isso?
Ele não me deixa louco. Eu não deixo as coisas dentro do meu controle me enlouquecer. O governo de Obiang chegou a representar o sigilo e as violações dos direitos humanos, mas essas são questões que nós da Guiné Equatorial e a comunidade global saberão como resolver. GE, tão ruim quanto é, não é o único caso de corrupção sistemática e impunidade. Regimes similares na Líbia e no Egito foram derrubados, e outros, como na Birmânia, parecem estar se movendo na direção certa, e é por isso que ele não me deixa louco.

Na medida em que a corrupção prossegue, você tem observado mudança na GE para melhor ou pior? Por quê?
Até agora, a Guiné Equatorial tem piorado. A razão de ser quando você tem um país pequeno, com recursos limitados, em que a maioria das pessoas é pobre e a corrupção é sistemática, a quantidade de dano que a corrupção causa é comparativamente pequena. Mas, quando você tem um país com PIB per capita comparável ao Reino Unido ou Alemanha, e ainda uma família que mal administra toda essa riqueza, a disparidade ou desigualdade logo se tornam uma das partes criminais. Corrupção, neste contexto posterior, tem um cumulativo que não pode e não deve ser ignorado.Estamos falando de funcionários do governo que estão tomando milhões de dólares por meio de extorsão e subornos e afirmam que a lei autoriza. Estamos falando também sobre funcionários do governo cuja posição depende de sua inquestionável lealdade para a família presidencial. Até que nós, o povo da Guiné Equatorial, percebamos que a corrupção está prejudicando todos nós, a família presidencial e seus comparsas vão continuar a praticá-la.

Como pode ativistas internacionais, como os nossos membros ONE, ajudarem a melhorar a transparência na GE para além de assinar nossa petição?
Nós precisamos que a comunidade mundial colabore. Nós não podemos resolver sozinhos este problema. De longe a coisa mais importante que você pode fazer é ser voz em suas comunidades. As autoridades governamentais nos EUA são sensíveis a você como os seus constituintes e se você fizer da transparência global na indústria extrativa uma agenda de prioridades para eles, então você estará ajudando a resolver problemas de pobreza e desigualdade em lugares distantes como a Guiné Equatorial.

Então, nós temos mais de 130.000 assinaturas na nossa petição transparência de extrativos. Como isso faz você se sentir?
Eufórico, extremamente feliz. Precisamos de todo o apoio que podemos obter para começar a fazer da transparência extrativa uma pedra angular das relações internacionais, política externa e comércio global. Eu realmente agradeço a ONE por escolher este tema, por trazê-lo a atenção de seus partidários em todo o mundo.

Qual é a coisa mais interessante que as pessoas precisam saber sobre a corrupção como um fenômeno?
Corrupção é mais do que dinheiro e estilos de vida luxuosos. Trata-se de seres humanos. Costumo dizer a história de uma irmã que morreu quando tinha 21 anos, no hospital central de Malabo - capital da Guiné Equatorial - sem a presença de médico, de medicamento necessário que poderia tê-la salvo ou eletricidade. Igualmente, um primo, três anos mais jovem que eu, morreu da mesma forma. Quase todas as famílias no meu país podem contar essa história sobre um parente. E, para mim, isso é um problema, a corrupção. Quando o dinheiro que deveria ser usado para garantir aos povos a dignidade básica e a vida é desviado para comprar mansões, jatos particulares e carros de luxo, os seres humanos morrem. A corrupção tem um preço tremendo.
Fique em contato com Tutu Alicante no Twitter em @EGJustice. E tome medidas pedindo aos líderes europeus para enfrentarem o lobby empresarial contra as leis propostas da UE que obrigam as empresas de petróleo, gás e mineração a publicarem os pagamentos aos governos estrangeiros. 
Por Malaka Gharib
Versão em Português: Monica Brito

Nenhum comentário:

Postar um comentário